" Já não para dizer que a Gestapo estava em toda parte e o poder do estado era total. Também não dá para dividir os alemães em dois polos opostos: o dos seguidores cegos de Hitler e o das vítimas ou combatentes da resistência. ", diz Johnson, relativizando a gigantesca dimensão atribuída à instituição por pesquisadores no pós-guerra. Em Krefeld, por exemplo, com 170 mil habitantes, a polícia secreta tinha apenas 13 oficiais (um para cada 13 mil habitantes). No total, a Gestapo contava com 32 mil integrantes em 1944. Para ter uma ideia, as SA tinham 2,9 milhões, dez anos antes. Com a equipe restrita, como a instituição conseguiu criar nas pessoas a percepção de que eram vigiadas o tempo todo (pergunta). Eis a colaboração do " alemão comum ". Qualquer um era tomado de pânico só de receber a carta timbrada convocando para " responder perguntas ". Mas o ponto é: sem a ajuda dos vizinhos e companhia, a Gestapo não teria a mesma eficiência. Entre 1933 e 1939, 41% dos processos contra judeus em Krefeld foram iniciados por denúncias de civis. Em outras cidades, não foi diferente. Alguns fofoqueiros chegaram a integrar uma " rede de espionagem " da instituição. Ninguém sabe ao certo seu tamanho. Em Nuremberg (2,7 milhões de habitantes, em 1941), havia 80 informantes para os 150 funcionários. Vários colaboradores eram antissemitas, e outros, indiferentes - mas, em geral, receptivos à propaganda nazista. E disposto a dedurar pelo bem do país ou resolver desavenças pessoais, até rixas com ex-amante. Uma cliente insatisfeita, da cidade de Mitelberg, denunciou Ludwig Hell por vender aguardente a uma judia em seu armazém, em novembro de 1941. Depois de passar pela loja de manhã, Helen Pfaff voltou à tarde para comprar uma cola extra de " produtos escassos ", Hell recusou-se a atendê-la, mas serviu, sem cerimônia, a freguesa seguinte, uma judia. Pfaff reclamou à Gestapo. O comerciante teve de jurar que nunca mais faria algo parecido e permaneceu sob vigilância. Já o doutor Kneisel declarou que se sentia obrigado a denunciar Ilse Sonja Totzke por seu " dever como oficial da reserva ". " Á medida que o regime se tornava mais totalitário, sobretudo durante a guerra, aí sim a Gestapo infundiu muito medo e adquiriu cada vez mais poderes para apertar os mecanismos de controle. Dessa forma, o que era permissível em 1935 terminava com prisão ou morte em 1943, afirma o historiador Andrés Reggiani, da Universidade Torcuato Di Tella. " Não esperamos ser amados por muitos ", dizia Himmler. Bastava o conformismo dos cidadãos. " O que o regime precisava era estabelecer a linha oficial, obter a cooperação e atuar sem descanso com base na informação recebida ", afirma Gellately. Foi o que a Gestapo fez, sem que quase ninguém na Alemanha reclamasse da matança de 6 milhões de judeus, além de gays, ciganos e outras minorias. Em 1946, o Tribunal de Nuremberg julgou os 22 criminosos de guerra mais importantes da Alemanha. Doze foram condenados à morte. A Gestapo foi definida como uma organização criminosa e a corte resolveu que os responsáveis pagariam por seus crimes. Mas vários manda-chuvas menos conhecidos, como Richard Schulenburg, puderam reorganizar sua vida normalmente. Aos 68 anos, o ex-chefe de assuntos judaicos em Krefeld pleiteou uma pensão do Estado. Submeteu-se a um processo de " desnazificação ", em que teve de convencer um comitê da cidade sobre seu passado impoluto. Juntou referências de moradores e jurou ter cometido delito: " Eu tratava com humanismo todas as pessoas ". Não conseguiu a pensão, mas seu advogado apelou, justificando que ele fora obrigado a integrar a Gestapo. Deu certo: recebeu pensão até morrer, aos 82 anos, Karl Loffer, da polícia secreta de Colônia, também se reabilitou com cartas de apoio de líderes das Igrejas católica e protestante. Diretor-geral do departamento dedicado aos judeus. Adolf Eichmann fugiu para a Argentina, mas foi capturado por israelenses em 1960 e condenado à morte. Diversos companheiros dele, contudo, continuaram gozando a boa vida na América do Sul - sabe-se lá onde mais. Saiba mais: Livros: Gestapo and German Society, Robert Gellately, Oxford University Press, Oxford, 1990. O papel de alemães comuns como força da polícia. Sem edição no país. E será lançado em breve, Apoiando Hitler. Nazi Terror, Eric A. Johnson, Perseus Books, 2002. Rica em arquivos da Gestapo, oferece uma análise dos motivos que levaram civis a cooperar na caça aos judeus. História da Gestapo, Jacques Delarue, Record, 1962. O autor participou da resistência francesa e acompanhou alguns processos contra os nazistas.
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quinta-feira, 31 de agosto de 2017
Parte 3 - Gestapo e Adolf Hitler.
" Já não para dizer que a Gestapo estava em toda parte e o poder do estado era total. Também não dá para dividir os alemães em dois polos opostos: o dos seguidores cegos de Hitler e o das vítimas ou combatentes da resistência. ", diz Johnson, relativizando a gigantesca dimensão atribuída à instituição por pesquisadores no pós-guerra. Em Krefeld, por exemplo, com 170 mil habitantes, a polícia secreta tinha apenas 13 oficiais (um para cada 13 mil habitantes). No total, a Gestapo contava com 32 mil integrantes em 1944. Para ter uma ideia, as SA tinham 2,9 milhões, dez anos antes. Com a equipe restrita, como a instituição conseguiu criar nas pessoas a percepção de que eram vigiadas o tempo todo (pergunta). Eis a colaboração do " alemão comum ". Qualquer um era tomado de pânico só de receber a carta timbrada convocando para " responder perguntas ". Mas o ponto é: sem a ajuda dos vizinhos e companhia, a Gestapo não teria a mesma eficiência. Entre 1933 e 1939, 41% dos processos contra judeus em Krefeld foram iniciados por denúncias de civis. Em outras cidades, não foi diferente. Alguns fofoqueiros chegaram a integrar uma " rede de espionagem " da instituição. Ninguém sabe ao certo seu tamanho. Em Nuremberg (2,7 milhões de habitantes, em 1941), havia 80 informantes para os 150 funcionários. Vários colaboradores eram antissemitas, e outros, indiferentes - mas, em geral, receptivos à propaganda nazista. E disposto a dedurar pelo bem do país ou resolver desavenças pessoais, até rixas com ex-amante. Uma cliente insatisfeita, da cidade de Mitelberg, denunciou Ludwig Hell por vender aguardente a uma judia em seu armazém, em novembro de 1941. Depois de passar pela loja de manhã, Helen Pfaff voltou à tarde para comprar uma cola extra de " produtos escassos ", Hell recusou-se a atendê-la, mas serviu, sem cerimônia, a freguesa seguinte, uma judia. Pfaff reclamou à Gestapo. O comerciante teve de jurar que nunca mais faria algo parecido e permaneceu sob vigilância. Já o doutor Kneisel declarou que se sentia obrigado a denunciar Ilse Sonja Totzke por seu " dever como oficial da reserva ". " Á medida que o regime se tornava mais totalitário, sobretudo durante a guerra, aí sim a Gestapo infundiu muito medo e adquiriu cada vez mais poderes para apertar os mecanismos de controle. Dessa forma, o que era permissível em 1935 terminava com prisão ou morte em 1943, afirma o historiador Andrés Reggiani, da Universidade Torcuato Di Tella. " Não esperamos ser amados por muitos ", dizia Himmler. Bastava o conformismo dos cidadãos. " O que o regime precisava era estabelecer a linha oficial, obter a cooperação e atuar sem descanso com base na informação recebida ", afirma Gellately. Foi o que a Gestapo fez, sem que quase ninguém na Alemanha reclamasse da matança de 6 milhões de judeus, além de gays, ciganos e outras minorias. Em 1946, o Tribunal de Nuremberg julgou os 22 criminosos de guerra mais importantes da Alemanha. Doze foram condenados à morte. A Gestapo foi definida como uma organização criminosa e a corte resolveu que os responsáveis pagariam por seus crimes. Mas vários manda-chuvas menos conhecidos, como Richard Schulenburg, puderam reorganizar sua vida normalmente. Aos 68 anos, o ex-chefe de assuntos judaicos em Krefeld pleiteou uma pensão do Estado. Submeteu-se a um processo de " desnazificação ", em que teve de convencer um comitê da cidade sobre seu passado impoluto. Juntou referências de moradores e jurou ter cometido delito: " Eu tratava com humanismo todas as pessoas ". Não conseguiu a pensão, mas seu advogado apelou, justificando que ele fora obrigado a integrar a Gestapo. Deu certo: recebeu pensão até morrer, aos 82 anos, Karl Loffer, da polícia secreta de Colônia, também se reabilitou com cartas de apoio de líderes das Igrejas católica e protestante. Diretor-geral do departamento dedicado aos judeus. Adolf Eichmann fugiu para a Argentina, mas foi capturado por israelenses em 1960 e condenado à morte. Diversos companheiros dele, contudo, continuaram gozando a boa vida na América do Sul - sabe-se lá onde mais. Saiba mais: Livros: Gestapo and German Society, Robert Gellately, Oxford University Press, Oxford, 1990. O papel de alemães comuns como força da polícia. Sem edição no país. E será lançado em breve, Apoiando Hitler. Nazi Terror, Eric A. Johnson, Perseus Books, 2002. Rica em arquivos da Gestapo, oferece uma análise dos motivos que levaram civis a cooperar na caça aos judeus. História da Gestapo, Jacques Delarue, Record, 1962. O autor participou da resistência francesa e acompanhou alguns processos contra os nazistas.
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